PEC 32 favorece contratações sem concurso

População pode ficar sem serviços gratuitos com reforma Administrativa

A proposta da Reforma Administrativa Federal, objeto da PEC 32, pode levar ao desmonte do serviço público. Pois, possibilita aos governantes a liberdade para contratação direta, em larga escala, favorecendo o apadrinhamento político e o uso de cargos como moeda de troca, reforçando antigas práticas fisiológicas.

A previsão é de que o parecer do relator, favorável à admissibilidade da PEC 32, seja votado ainda nesta semana na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara dos Deputados.

Não há necessidade de instituir tal mecanismo, pois a Constituição já admite nomeações em cargos de livre provimento para as funções de assessoramento, chefia e direção, atendendo ao direito dos chefes dos Três Poderes de contratarem pessoas de sua confiança. A PEC 32 transforma a exceção em regra, sugerindo que a maioria dos cargos passe a ser de livre provimento. Essa distorção ameaça a isonomia, a imparcialidade, a eficiência e a moralidade, atributos que inspiram os preceitos constitucionais e republicanos.

A reforma Administrativa é o desmonte do serviço público para que, sem pressão da sociedade, o governo passe para a iniciativa privada tudo que hoje é gratuito, como a educação, a saúde, a previdência, a segurança, as estatais e os órgãos de controle que fiscalizam o próprio governo.

É grave o fato de a proposta de Reforma Administrativa atingir exatamente os servidores que mais trabalham e prestam serviços diretos à população, como professores, médicos, enfermeiros, nutricionistas, fisioterapeutas, policiais, pesquisadores dos institutos e universidades, atendentes de repartições como as do INSS, assistentes sociais, escriturários e outros profissionais que atuam em atividades importantes para a sociedade, principalmente para a parcela de menor renda.

Se a PEC 32 for aprovada, o serviço público vai atuar na “sobra do mercado”, ou seja, só vai ser público o que a iniciativa privada não quiser porque não dá lucro. Até a segurança pública pode ser entregue a entes privados e há “risco iminente de terceirização e extinção das guardas municipais em todo o País“, alertou a diretora jurídica da Federação Nacional de Sindicatos de Guardas Municipais do Brasil, Rejane Soldani Sobreiro, em audiência pública, segundo a Agência Câmara.

Mais uma redundância

A proposta visa, também, modificar os atuais limites para despesa com pessoal, contrariando a Lei Camata (nº 82/1995), de autoria da ex-deputada Rita Camata. Ou seja, não é necessário legislar sobre dispositivo já existente e que, se é desrespeitado, não é em função dos salários dos concursados, mas sim dos cargos de livre provimento de pessoas contratadas em cada nova administração.

Outra alteração grave proposta pela PEC 32 consiste em mexer na jornada dos servidores, com redução de sua remuneração quando a autoridade constatar desequilíbrio das contas. Isso retira a segurança dos servidores para planejar sua vida e a de seus dependentes. Ademais, quais serão os critérios para se balizar a redução salarial? Ou seja, se houver gastos indevidos, mau emprego das verbas, despesas voluptuárias dos governos ou de qualquer forma ocorrerem gastos excessivos, o que ocorre com frequência, o servidor pagará a conta.

Funções extintas

Outro argumento distorcido da PEC 32 diz respeito a cargos referentes a funções não mais existentes, como, por exemplo, de operador de telex. Porém, já há decisões administrativas no sentido de que a extinção de cargos, funções ou empregos deve ser feita, em regra, por meio de lei de iniciativa do chefe do Poder Executivo, ou por meio de decreto.

No caso do Executivo Federal, a autorização está inserida nos incisos VI, “b”, e XXV do artigo 84 da Constituição, sendo desnecessária a reforma também neste tema. Dispõe o artigo 41 da Carta, no parágrafo terceiro, que o servidor estável deverá permanecer em disponibilidade se o cargo for extinto ou for declarada sua desnecessidade, assegurada a remuneração na forma do dispositivo, até adequado aproveitamento em outro cargo.

Assim têm agido prefeitos e governadores, com o amparo do princípio da simetria. Vale dizer que o teor das decisões e da própria norma constitucional desmonta a alegação de que o aproveitamento do servidor pode configurar desvio de função. Considerados todos esses pontos, são inconsistentes os argumentos do Governo Federal.

Na contramão dos interesses da sociedade

O governo caminha na contramão do anseio popular. Afinal, os brasileiros nunca precisaram tanto do Estado, ou seja, dos servidores que lhes atendem diretamente, neste momento tão grave, em que é essencial garantir o bem-estar social, traduzido por mais serviços públicos eficientes e com excelência. Por isso, se espera que deputados federais e senadores impeçam a aprovação de um proposta com foco errado, justificada equivocadamente na correção de um rombo fiscal de responsabilidade única dos gestores do dinheiro público.

A pandemia demonstrou a importância do SUS. A reforma pode acabar com o atendimento gratuito nos hospitais e postos de saúde. Ao privatizar a saúde pública, o governo pode impedir que todos tenham acesso à vacina gratuita, seja a gripe, a Covid-19, sarampo e outras doenças, por exemplo.

Com o fim da obrigatoriedade de ter servidor concursado em escolas, a administração das unidades de educação passa para as mãos de sistemas de ensino particulares, que podem cobrar taxas e mensalidades dos estudantes. Isto pode ocorrer do ensino fundamental ao superior, afetando todo o sistema educacional do país.

Ibama, a Anvisa, o IBGE, a Fiocruz e até universidades federais poderão ser extintas como uma só canetada do presidente. Além da perda de milhares de empregos num momento de crise econômica e sanitária, o país ficará à mercê de estudos estrangeiros, sem verbas para pesquisas científicas, deixando os brasileiros e brasileiras cada vez mais dependentes de remédios e insumos de outros países.

O fim do IBGE, por exemplo, significa o fim de pesquisas econômicas e sociais que norteiam as políticas públicas governamentais. O país ficará cego, sem saber que rumo tomar.

 

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